*Por Marcos Coimbra
Observa-se hoje no Brasil, na prática, uma verdadeira proibição da utilização de automóveis por particulares. De início, existe a novela da aquisição de veículos. Caso a vítima não possua o numerário suficiente para a compra a vista, cairá em uma rede de exploração, consubstanciada pelas draconianas condições de financiamento. Pagará muito mais do que o valor real do bem. Continua o drama com o emplacamento etc. O vendedor leva uma polpuda comissão, caso a venda seja financiada. O carro usado, dado como entrada, terá uma avaliação ínfima.
Quando trafega na rua, passa a ser vítima da indústria de multas existente, pois empresas particulares, em convênio com os DETRAN´s da vida, engendram verdadeiras armadilhas para aumentar a arrecadação proveniente de multas. Já criaram até metas de arrecadação deste tipo de receita, em várias circunscrições. Absurdos são perpetrados e, quando o cidadão recorre, seu recurso é julgado, com extrema má vontade, justamente pelos que multaram. Entra também neste rol as punições impostas pelas “blitzs” dos famigerados “choques de ordem” ou da “lei seca”. Mesmo que passe no teste do bafômetro, o cidadão passará por um crivo digno da inquisição, na tentativa de apanhá-lo em algum deslize. O importante é multar e aumentar a renda das empresas e das “autoridades” coniventes.
O trânsito é um verdadeiro inferno. Engarrafamentos monstruosos a qualquer hora do dia, em praticamente todos os locais. O transporte público é caótico. Nada funciona. Metrô, barcas, trens, é tudo ineficaz. Há claramente a intenção de beneficiar o transporte por ônibus, não fosse ele o segmento responsável pelo principal financiamento de campanhas eleitorais. Ninguém é eleito para um cargo majoritário, por exemplo, no Rio de Janeiro, sem o seu apoio. Agora, acaba de ser criado o BRS (Bus Rapid Service) no município do Rio de Janeiro, primeiro na Avenida N. S. de Copacabana, por intermédio de um corredor expresso em duas vias, prioritário para os ônibus nas faixas da direita. A da esquerda ficará para táxis etc. E os motoristas dos carros particulares assistirão, como na Alameda São Boa Ventura, parados no congestionamento, dois ou três ônibus desfilando pelas vias expressas em alta velocidade. Tal sistema será implantado em outras vias importantes, tornando impossível o tráfego de automóveis particulares. Os empresários do setor de ônibus esfregam as mãos de contentamento. Vão diminuir a quantidade de viaturas empregadas, aumentando o número de passageiros e, consequentemente, seus lucros.
As autoridades governamentais estimulam, de todas as formas possíveis, a compra de automóveis pelos ingênuos incautos. Ganham no aumento de produção de automóveis pelas montadoras, na cobrança dos impostos e na aceleração do crescimento econômico do sistema, pois o segmento produz um bem durável destinado ao consumo final, com um razoável valor agregado, criando ainda empregos. Foram oferecidas condições irreais de financiamento até poucos tempos atrás, com possibilidade de financiamento por mais de 60 meses. Muitos cidadãos, sem a mínima condição real de adquirir e manter um automóvel, entraram na esparrela.
A maioria não possui condições de sequer manter o veículo, arcando com o ônus de pagar IPVA (4% no Rio de Janeiro), pedágios crescentes em todos os sentidos, seguro, DPVAT, combustível etc. O estacionamento virou um verdadeiro faroeste. Nas calçadas, os “flanelinhas” privatizaram o espaço público, cobrando o que querem, sem haver qualquer ação das autoridades (ir)responsáveis para propiciar um “choque de ordem”. Os “shoppings centers” cobram valores extorsivos, variando dia a dia, sem a devida repressão das “autoridades”. Os consumidores consomem naquelas verdadeiras “catedrais” do dispêndio e ainda pagam.com um sorriso nos lábios, pelo direito de estacionar o carro na garagem.
Só no Brasil. Cidadãos norte-americanos em visita ao nosso país não acreditaram que aqui ocorria isto, pois lá basta mostrar o comprovante de gasto, em determinados valores, no shopping para ficar isento de qualquer pagamento. Os legislativos estaduais tentam disciplinar a área, mas suas iniciativas são derrubadas pelo Judiciário por serem inconstitucionais. De acordo com esta interpretação, cabe ao legislativo federal o estabelecimento das normas sobre o assunto, mas seus integrantes nada fazem. O Legislativo deixou de ser um Poder e passou a ser um departamento do Executivo. É evidente que o incauto que comprou o carro sem condições de mantê-lo, atrasa as prestações e termina por ter o bem apreendido, além de ser inscrito no Serasa como inadimplente.
Enquanto aumenta nas ruas o número de veículos transitando, além de não serem realizadas obras de expansão dos espaços das vias, as autoridades criam obstáculos ao livre trânsito das viaturas particulares. Caso o infeliz cidadão tenha um assunto a resolver no DETRAN-RJ sofrerá um verdadeiro suplício de Tântalo, seja qual for a necessidade. Recentemente, tivemos que ir à unidade do Catete, verdadeira sucursal do inferno, a fim de tirar a 2ª via da cédula de identidade, já muito antiga, pois emitida na época do IFP (Instituto Félix Pacheco). Não entendemos até agora a razão de o DETRAN ter assumido a função do IFP, mas fomos para o sacrifício. Para resumir, tivemos que ir quatro vezes ao local para poder obter o documento. A cada dia, era feita uma nova exigência, estapafúrdia. Na 1ª vez, levamos foto 3x4, de terno, com fundo branco, de acordo em o estipulado na página do DETRAN e foi afirmado pela coordenação do posto que ela não servia. Tinha que ser tirada na máquina de lá, para não haver reflexo, pois usamos óculos, sem este complemento. Mostramos que a foto não tinha reflexo, mas afirmaram que só sem óculos.
Na penúltima vez, achamos que a implicância deles era privilégio nosso, mas, após horas de espera (lá não funciona na prática o atendimento preferencial para idosos etc.), descobrimos, conversando com as pessoas que lá estavam, que ela é democrática. Atinge a todos. Casos absurdos, muito piores que o nosso, foram descritos. Este espaço não é suficiente para descrevê-los.
De fato, é uma benção dos céus não possuirmos automóvel. Para que?
Correio eletrônico: mcoimbra@antares.com.br
*Professor, Marcos Coimbra
Conselheiro Diretor do CEBRES, Membro da Academia Brasileira de Defesa e da Academia Nacional de Economia, Autor do livro Brasil Soberano.
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