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terça-feira, 5 de abril de 2011

ALENTOS PARA A VERDADE SUFOCADA I

General da Reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva*


Ainda que tarde, é preciso desmentir inverdades exaustivamente disseminadas sobre a Contra-revolução de 31 de Março de 1964, o período de governos militares, a luta armada da esquerda revolucionária e a redemocratização do Brasil a partir de 1978.

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É um projeto que demanda uma sequência de textos onde sejam apresentadas ideias pouco exploradas, capazes de se oporem a paradigmas criados pela esquerda.

A Contra-revolução de 31 de Março de 1964 tinha o objetivo de implantar uma ditadura de direita no Brasil? Não.

A Contra-revolução teve como propósito impedir a implantação de uma ditadura comunista, por meio de um golpe articulado pelo governo de Jango e o PCB. Todos os presidentes militares reconheciam como de exceção o regime de 1964 e manifestavam publicamente o propósito de retorno à normalidade democrática. Uma ditadura jamais pregaria a sua própria extinção, o que comprova o perfil sui generis da “ditadura (?) militar” no Brasil.

Há ditaduras e “ditaduras”, assim como há democracias e “democracias”. Por paradoxal que seja, a Alemanha Oriental se denominava República Democrática Alemã e a Venezuela de hoje é considerada uma democracia por muita gente. Tais designações dizem pouco ou nada, pois o importante é o que a legislação do país assegure em termos de liberdade e direitos da pessoa humana. Ainda que sob uma lei de exceção, consubstanciada no AI-5, a maioria dos cidadãos designa aquele momento histórico de diversas formas: regime militar; período de governos militares; regime autoritário; ou até mesmo “ditabranda”. Nem todos o chamam de ditadura militar e praticamente ninguém o denomina de regime totalitário. Este era, sem dúvida, o que vigorava nas catedrais comunistas que orientavam a esquerda revolucionária no Brasil, modelo sonhado pelos grupos armados da guerrilha brasileira. A controvérsia existe porque, no íntimo, a maioria reconhece terem sido preservados muitos direitos e liberdades individuais durante a vigência do AI-5, que pouco afetava o cidadão comum.

O regime militar manteve os três Poderes da União e havia eleições livres e diretas para o Congresso Nacional e assembléias legislativas estaduais. Naquele período, podiam ser identificadas quatro correntes políticas em ação no País. Duas delas, democráticas, estavam no centro do espectro ideológico, abrigadas nos dois partidos reconhecidos. O MDB, oposicionista, cuja bandeira era a imediata redemocratização; e a ARENA, partido do governo, que defendia a redemocratização de forma gradual. À esquerda do MDB, havia a corrente revolucionária, cujo objetivo era implantar uma ditadura como a cubana ou chinesa. Essa linha radical ganhou força após o fracasso da estratégia de modelo soviético de tomada do poder pela “via pacífica” (subversão – infiltração – luta armada como último recurso) entre 1961 e 1964. A esquerda revolucionária se preparava para implantar a guerra de guerrilhas no Brasil desde o início dos anos 1960 com apoio da URSS, Cuba e China. As ações violentas de vulto começaram em 1966 e intensificaram-se a partir de 1968. A radicalização da esquerda revolucionária deu força não só ao partido do governo, em seus propósitos de redemocratização mais lenta, como à linha direitista do regime. Dessa forma, a volta à normalidade democrática demorou cerca de dez anos, tempo que demandou a neutralização completa da luta armada urbana e rural, num embate onde houve sérias violações de ambos os lados.

A volta à democracia não se deve à esquerda revolucionária, pois o governo militar só iniciou a redemocratização em 1978, após a completa derrota da luta armada. Na cruzada da redemocratização estavam o governo, os partidos políticos - ARENA e MDB - e diversos setores representativos da nação, todos atuando dentro da legalidade. Em seu discurso de posse, a presidente Dilma comete alguns equívocos ao dizer que “Minha geração veio para a política em busca da liberdade, num tempo de escuridão e medo. Aos companheiros que tombaram nesta caminhada, minha comovida homenagem e minha eterna lembrança”. A presidente tomou a parte pelo todo, pois a imensa maioria de sua geração, e do povo brasileiro, não optou pela luta armada, apoiou o Estado na neutralização da esquerda revolucionária e, ao mesmo tempo, os segmentos políticos e sociais que buscavam a redemocratização pela via legal. Os guerrilheiros eram sempre denunciados pelos cidadãos e, por isso, viviam homiziados, não se sentindo seguros no meio do povo. Não fosse assim, a luta teria sido muito mais dura, como mostra a história quando a guerrilha é popular. Da mesma forma, a presidente ainda insiste em que ela e seus companheiros de luta armada estavam “em busca da liberdade”, após tantos deles reconhecerem que o propósito era implantar uma ditadura nos moldes da soviética, da chinesa e da cubana.

A esquerda revolucionária depôs as armas após ser derrotada e, anistiada, saiu da ilegalidade e aceitou as regras do jogo democrático. Na atualidade, muitos dos seus membros estão instalados em altos escalões dos Poderes da União onde deixam claro que não mudaram de ideologia, apenas realizaram um recuo estratégico, haja vista sua atuação nos espaços que ocupam, as bandeiras que empunham (vide o PNDH-3) e seu protagonismo no Foro de São Paulo, organismo que se propõe a reviver na América do Sul a experiência desastrosa do socialismo de estado no leste europeu.
 
 
*Professor emérito e ex-comandante da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil




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